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quinta-feira, 7 de junho de 2012

Famílias divididas entre a obrigação e o medo

Parentes de portadores de transtornos mentais convivem com pânico quando eles têm crises nervosas
Não é novidade que o redirecionamento do modelo de assistência em saúde mental no país determinou o fim das internações prolongadas em instituições que, na maioria dos casos, mais pioravam do que ajudavam na recuperação dos pacientes. A novidade é que, desde que a mudança foi colocada em prática, há um sofrimento silencioso entre milhares de famílias que não estão preparadas física, psicológica ou financeiramente para enfrentar uma situação que só quem conhece de perto é capaz de dimensionar.
Na casa do aposentado O., de 69 anos, em Volta Redonda, a vida virou de cabeça para baixo desde que, há três anos, um dos três filhos dele, de 24, passou a apresentar transtornos mentais. A agressividade piora a cada crise e já resultou na destruição de móveis e, pior ainda, em agressões físicas. O filho mais velho de O., de 32 anos, foi atacado com uma faca e levou dez pontos num dos braços. Outro, que é promotor de vendas, foi agredido com um golpe de pá na cabeça. "Só Deus e quem sofre na pele sabe o que estamos passando", diz o promotor de vendas, preocupado 24 horas com a integridade física dos pais.
Não é à toa. Numa das crises, o jovem agrediu a mãe, de 63 anos. Em outra, investiu contra o pai, que foi ferido na cabeça. "Só não foi pior porque meu cachorro avançou nele e consegui me soltar", relata o aposentado. Certo dia, o jovem diluiu na água guardada na geladeira de casa um dos medicamentos que estava tomando. Sem saber, o pai bebeu e precisou de socorro médico. A família inteira se preocupa com a segurança do rapaz, pois teme a reação de vizinhos. "A gente quer uma internação para ele se tratar, porque, em casa, ele não toma os remédios. Meus pais são pessoas idosas, que estão sofrendo muito", diz o irmão.
Segundo o aposentado, nem mesmo na hora de dormir é possível pegar no sono. "Já levantei de madrugada e o encontrei andando com um pedaço de ferro que arrancou de uma cadeira. Tenho medo por mim, pela minha mulher, pelos meus outros filhos e pelo que pode acontecer se ele atacar um vizinho", desabafa o aposentado. O medo não é em vão. Há poucos meses, no Limoeiro, um portador de doença mental matou com uma paulada na cabeça o membro de uma igreja evangélica que foi à casa da mãe dele. A mulher, idosa e doente, recebia atendimento voluntário da vítima.
"Tem muita gente na mesma situação que a nossa. Quando entra em crise, meu irmão cisma que alguém lá de casa está querendo matá-lo. E sua força se torna descomunal. Queremos que ele seja internado, mas em Volta Redonda isso não é possível. Em casa não há como ele se tratar", acredita o promotor de vendas. Detalhe: na sexta-feira (19), quando esta reportagem foi escrita, o rapaz com transtornos mentais estava novamente internado no Cais Aterrado, de onde já fugiu uma vez.